terça-feira, julho 06, 2004

Inveja

Entre as cidades, sobretudo as maiores e as mais antigas de um país, há sempre inveja. Sabemos como é entre Lisboa e Porto, por exemplo. O que é um perfeito disparate, acho eu. É que o Porto tem o Douro e Lisboa tem o Tejo, só para dar um exemplo. Ou seja, são à partida tão diferentes, que é impossível compará-las.
Na Bélgica, por exemplo, rivalizam as pequenas cidades flamengas com as da Valónia, sendo que Bruxelas é uma carta fora do baralho, por ser tão incaracterística...mesmo assim, quando lhes dá para isso, lá vai de compará-la com Antuérpia, o que não pode ser mais estranho, porque Antuérpia é a típica cidade portuária...
Na Holanda, para continuar nos exemplos nórdicos, senti uma enorme tensão entre Amsterdão e Roterdão. Quando visitei Roterdão, fiquei com uma impressão tão diferente da que tenho de Amsterdão, que não percebi como mediam forças...Mas aí sucediam-se experiências arquitectónicas que pretendiam mostrar ao mundo como Roterdão era a cidade do futuro, enquanto Amsterdão continuava a passear de barco pelos canais.
Na Alemanha, pela extensão e pelo sistema político, a rivalidade esgrime-se em toda a linha. Desde logo, entre o ocidente e o oriente, os "westies" e os "ossis", carinhosamente apelidados assim desde a integração política - a social, essa, leva mais tempo... Os preconceitos são de parte a parte: que os alemães ocidentais só pensam no dinheiro, são incultos e todos de direita, que os do antigo leste são atrasados, incapazes, pobres e desinteressantes. Uma espécie de Munique contra Berlim Leste...
Depois, há a disputa entre as cidades que querem ser chamadas de "culturais": a eterna Köln endinheirada e arrojada, no leste a Dresden em dificuldades, à procura de um passado que construa o futuro. E Berlim, claro, gozando do seu estatuto dúplice, gozando da sua geografia mágica, sobre ambas, como estrela.
É esta hibridez da cidade que constrói amores e ódios: se Berlim é uma cidade em construção e reconstrução, se ela tem acolhido e continuará a acolher artistas de toda a espécie, é porque o país o suportou durante anos e anos. A factura de uma partilha CDU e SPD na cidade ninguém a quer pagar. Há 20 anos, como há 10, ninguém imaginou que o país se recusasse a quotizar para Berlim. O resultado é uma falência técnica de tal ordem devastadora, que as negociações sindicais da função pública, por exemplo, se fazem à parte das negociações dos restantes estados. Aqui, houve este ano um corte salarial de 12%. A escolha era entre isso e o despedimento colectivo. Aqui, não se ouviu um ai...porque aqui ao menos brilha o que ainda está por pagar...

1 Comments:

Blogger César de Oliveira said...

eu fumo tabaco de enrolar, a marca é "amsterdamer". antes de saber que não está à venda na holanda (já sabia contudo que não se vende na alemanha... descobri em köln há dois anos), corria as tabacarias de rotterdam a tentar comprar. numa das últimas tentativas, o diálogo foi no mínimo interessante:

-"hello, do you have this tobacco? amsterdamer?"
-"no, i will not tolerate anything from amsterdam in my store"

uma excelente forma de perceber que os holandeses e as boas maneiras não se dão bem (mas isto foi no início, e a percepção ainda recolhia dados, ao contrário do momento presente em que a noção que levo disto está formada e é definitiva), mas também uma forma elucidativa de perceber a questão da rivalidade entre as duas cidades. e de perceber, ao longe, a rivalidade entre as nossas duas cidades.

e uma maneira de perceber que teria que pedir que me mandassem tabaco de portugal.

3:00 da manhã  

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