quarta-feira, junho 30, 2004
A ópera no canal 18
A Ópera de Mozart "Die Entführung aus dem Serail" é considerada como uma das peças mais populares do compositor. Normalmente, é encenada como comédia de costumes, tendo por pano de fundo um palácio turco, ao jeito do imaginário "Mil e Uma Noites".
Ora, o encenador Calixto Bieito, que tem deixado polémicas por onde tem passado, resolveu encenar este texto ao seu modo: diz ele que só faz o que reconhece nas peças. E fá-lo "realmente". Ou deveríamos dizer realisticamente?
É que em vez do palácio turco temos um bordel, em vez da Turquia temos uma cidade contemporânea, com sexo, drogas e violência qb, embora falte o rock&roll, porque enfim a peça sempre foi escrita antes da sua invenção... O resultado é um público dividido e um patrocínio retirado: o público ou se quer ver livre do catalão, ou o proclama um génio. A crítica é, em geral, demolidora. E nem a habitual abertura de espírito de Berlim parece querer salvar a obra...
O Welt aclama o catalão como encenador de teatro, mas rejeita-o em absoluto na Ópera. Aliás, o título do artigo que lhe é dedicado diz tudo: "O encenador Calixto Bieiro é o moralista-sexual da Ópera". E continua: "Carne nua, sexo, tortura, morte, profanação dos mortos e violação: tudo isto transfomra o catalão no próprio Lúcifer e no Exterminador implacável da Ópera." Para contrastar, descrevem-no como um homem dócil e esperto, profundamente católico e de educação jesuíta. Só para o descompor logo a seguir, chamado-lhe "socialista radical" e aproximando-o de Buñuel com quem o próprio diz identificar-se.
O Frankfurter Allgemeine Zeitung (FAZ) é menos cáustico, mas mais sarcástico. Começa por dizer que não é preciso esperar 10 minutos para assistir à primeira cena questionável: a primeira área é cantada sob o duche (mesmo), por um cantor só coberto por um "pullover natural"... Mas isto é apenas o começo do derramar de líquidos, tais como sangue, esperma e urina, aos quais o encenador se atém... Segundo o FAZ, o público está dividido: há aqueles que acham a encenação escandalosa, seja qual for a justificação artística, imaginando que Mozart terá dados umas quantas voltas na tumba, e os outros que acham que Mozart até se teria divertido. A questão permanece polémica e, diz o jornal, que as facções Buh e Bravo só chegam a um empate a zero...
Esse mesmo artigo questiona depois abertamente as opções do encenador, para acabar dizendo que ele cede à tentação do escândalo demasiado facilmente. Aliás, esta ópera teria sido composta com um propósito moralizador e não propriamente como provocação sem mais.
Sobra uma última questão: parece que a Daimler-Chrysler não quer ver o seu nome associado a esta encenação, tendo retirado o patrocínio à Komische Oper. Entre aqueles que bramam "muito bem" e que se espalham por toda a imprensa de consumo fácil, que essa sim assume a defesa e o controlo da moralidade acima de tudo, há felizmente ainda aqueles que perguntam até que ponto é que um patrocinador tem ou não o direito de intervir, mais ou menos directamente, nos espectáculos que apoia. É a independência do critério artístico que se quer proteger, acima de tudo, mesmo quando dele se discorda - e parece ser o caso.
Assim, caros Marretas, só me falta mesmo ir ver...
Para presenciar as cenas hilariantes que os jornais também descrevem: entre debandada dos espectadores e pedidos de reembolso, há quem grite, do público, após uma morte em palco: "a seguir vai o encenador!"
Calixto Bieito
Os Marretas pediram e a enviada especial pôs-se em campo. Avisa desde já que só tem informação indirecta (but who cares???). Para quem não lê os marretas (há gente para tudo), trata-se de averiguar de uma encenação feita por um catalão, de nome Calixto Bieito para a Komische Oper Berlin, de uma ópera de Mozart, que tem levantado grande escândalo, mesmo neste povo que não é de se chocar com qualquer coisita. O Jornal de Notícias resume.
Antes de mais, quem é o catalão...
terça-feira, junho 29, 2004
Saliências
Regressar significa sempre esbarrar naquela saliência hipócrita, em que se lê, em letras minúsculas: "o que não vejo, não existe". Máxima burguesa de gosto duvidoso, aliás, como tudo o que é burguês.
D'abalada
Pois parece que sim. O homem lá vai para Bruxelas.
O anúncio da decisão parece não ter tido efeito nenhum. É como a "Crónica de uma Morte Anunciada"...ou a pescada, em termos mais prosaicos: antes de ser, já o era.
Eu confesso: não deixo de sentir alguma alegria em finalmente vê-lo ir-se embora...o sentimento só se altera pelos calafrios de pensar quem aí vem.
Agustina
"A velhice começa quando a moral se declama. Como se fosse um texto de teatro, conduzido como uma pompa fúnebre."
Agustina Bessa-Luis, Os Espaços em Branco, Guimarães, 2003.
segunda-feira, junho 28, 2004
Sugestão de Leitura
Ontem, o Professor Martelo, decerto por distracção, esqueceu-se de mencionar a sugestão de leitura para os 25 (da Europa): Robert Musil, "O Homem sem Qualidades".
Podia também ter falado um pouco do herói pícaro. Tinha vindo a propósito.
Comando à distância
Quando Durão Barroso diz que Portugal não está desligado do contexto europeu quererá dizer que nos vai comandar à distância?
O país maníaco-depressivo
"A Doença Maníaco-Depressiva, também designada por Doença Bipolar, é uma doença psiquiátrica caracterizada por variações acentuadas de humor, com crises repetidas de depressão e "mania". Qualquer dos dois tipos de crise pode predominar numa pessoa, sendo a sua frequência bastante variável. As crises podem ser moderadas ou leves."
domingo, junho 27, 2004
Do dia
Prato do dia: pescadinhas de rabo na boca, ou em alternativa cherne na grelha com couves de Bruxelas.
Sensações do dia: impaciência, cansaço, indefinição.
Tempo e estado das estradas: nublado em jeito de limbo. Armadilhas nas curvas.
Lema: Nem o pai morre nem a gente almoça.
Papel de parede: papel pardo.
Adivinha: uma meia meia feita, outra meia por fazer, digam lá meus meninos, quantas meias vem a ser?
Lição: emigrar é o que está a dar.
Prós: para a frente é que é o caminho!
Contras: quem tudo quer, tudo perde.
No fundo: o rei está morto, viva o rei!
sábado, junho 26, 2004
Cadavre-exquis
Cabeça de um, corpo de outro, e uns restos à mistura - eis a receita para um bom cadavre-exquis.
Mais uma coisa...
Eu gostava de pedir ao senhor Presidente da República, o tal que é de todos os portugueses, que ponha ordem na casa, sff. A democracia é para ser exercida. Nós estamos prontos, sempre estivémos, para ir a votos. Estarão Vossas Excelências?
Im-possibilidades
- O Presidente não está constitucionalmente obrigado a convocar eleições, mas pode fazê-lo;
- O Presidente não está constitucionalmente obrigado a designar primeiro-ministro o líder do partido mais votado;
- Eleições antecipadas resultariam no que já se sabe: PSD vai ao funeral do PP e entretanto temos as víboras socialistas a morder rabos indiscriminadamente para ver se mandam mais;
- Eleições antecipadas revelariam o que já se sabe: que nos sentimos todos ultrajados por esta manobra torpe e inqualificável de alguém que, há dias, nem sequer era candidato a Bruxelas;
- Eleições antecipadas trariam cor à nossa vida nacional;
- Eleições antecipadas lançariam o país no caos;
- Sem eleições antecipadas teríamos um Presidente totalmente incapaz;
- Sem eleições antecipadas teríamos o Santana como Primeiro-Ministro, figura que nunca se perfilou para o lugar e que, portanto, estava longe da cabeça dos eleitores há 2 anos e meio;
- É verdade que votamos em Partidos, mas se eles não fossem feitos por pessoas, iríamos a eleições uma vez, definiríamos a nossa pertença política e nunca mais precisávamos de abrir a boca - também é uma possibilidade;
- Se Durão já anunciou a sua decisão aos 25, por que não a anunciou aos 10 milhões a quem deve, antes de mais, respeito? É possível que esteja naquela habitual chachada da política nacional em que se encenam dilemas, quando nos bastidores ocorrem verdadeiros golpes;
- Se tivéssemos eleições antecipadas, teríamos Ferro como Primeiro-Ministro.
Mau...
então andamos a brincar ou quê? Primeiro é o Guterres que nos deixa à deriva, agora este quer marchar para Bruxelas...E os tansos, como eu, vão votar para permitir que estes senhores brinquem aos primeiros-ministros!
sexta-feira, junho 25, 2004
Homónimas
Se esta proliferação de Ineses de qualidade continua, qualquer dia viro um bocadinho esquizofrénica, mesmo sem precisar de teste...
Conglatulations
Uma das minhas colegas de alemão, desta feita uma japonesa, enviou-me um mail. Escreveu: "Conglatulations! You've maid it!" Nunca mais nos livramos desta fama de sopeiras, caramba!
Paradoxos #4
Que a Orquestra Filarmónica de Viena tenha tão poucas mulheres e toque tão estrondosamente bem.
Quota, parcela, quinhão
"Quota", do latim quota. Substantivo feminino; porção determinada, quinhão de cada um, parcela, prestação, cota. (Dicionário Priberam online)
Notas:
- Não gosto da Ferreira Leite (quem gosta?!), nem da Leonor Beleza (idem), mas confesso que lhes tiro o chapéu na resposta ao Ministro da Saúde, com aquele dislate sobre quotas em Medicina;
- Não referi que a Orquestra de Viena só aceita mulheres há muito pouco tempo. Contei 5 no conjunto da Orquestra. Se a dita orquestra não fosse excepcional, já não tinha gostado. Resta saber se é excepcional "por causa de" ou "apesar de".
quinta-feira, junho 24, 2004
PORTUGAL
PORTUGAL. GANHÁMOS, PÁ!
Ataque cardíaco iminente em frente ao computador. Ruído de fundo o vento e os gritos dos bifes na Potsdamer Platz. Tudo via net. Sem imagem. Só números. Não sabia que era tão aficionada.
(Tudo sobre my misma, segue dentro de momentos. É só tomar o comprimido.)
Autor
As declarações do Ministério da Educação sobre o erro na prova de História, que atribui declarações de Ramalho Eanes a Costa Gomes, foram para mim uma surpresa: parece que a troca não era muito relevante, porque aos alunos era apenas pedido que comentassem o texto. Pelos vistos, a autoria do mesmo não era para tanto relevante... E mais: dizia o ME que os alunos mais atentos teriam dado pelo erro. Ora, se os alunos poderiam ter dado pelo erro, resta saber por que razão não deram por ele os professores pagos para elaborar o exame.
Irritante
Já li muita coisa sobre a ideia de cobrar os passes sociais de acordo com o escalão do IRS. Hoje, li um post do Barnabé sobre o assunto, que me irritou muito. Tal como o costumeiro discurso da esquerda que assume que só os Belmiros&Cia. pagam o IRS pelo escalão mais alto - ou deveriam pagar. Isto é o mais completo disparate: há muitos contribuintes que pagam pelo escalão mais alto! Nem todos os contribuintes são trafulhas! Há muitos portugueses a quem as Finanças vão buscar uma talhada enorme! Não se trata nem de Belmiros, nem de Champalimauds, necessariamente. E que andam de transportes públicos, sim!
Por outro lado, também me irrita este discurso da direita liberal que em vez de dizer claramente que não acredita no princípio redistributivo da riqueza, que subjaz à cobrança de impostos, inventa sucessivamente formas de ir ao bolso dos honestos, a quem já as Finanças rapinaram uma fortuna. Resumindo: se eles já pagam mais impostos e se vão pagar mais em tudo o resto, acabam pior do que quem tem objectivamente menos rendimentos! Tiro no pé: a fraude fiscal passa a ter justificação!
Resumindo, como se tem dito e voltado a dizer, só com o combate à fraude e evasão fiscal se chega a algum lado. E essa de ir buscar várias vezes à mesma fonte, essa não vale...
A direita deita as mãos à cabeça a ver onde vai buscar mais uns tostões, a esquerda vai zurzindo vergastadas no ar à moda do Louçã.
E esses meninos que opinam, têm as declarações de IRS em dia? E as prestações à Segurança Social também?
Sobre a derrota alemã
Reina por aqui o alívio. Agora, a minha alma lusa pode expressar-se livremente.
quarta-feira, junho 23, 2004
Um problema de (des)gosto
É bem sabido que o tema do gosto é um tema filosófico de longa história, que pertenceu primeiro à Filosofia e depois se tornou também reduto da Estética. Aliás, quem lhe dá enorme importância são os empiristas ingleses, seguidos depois pelos alemães, na alvorada da Estética.
Rodeada de um anátema fundamental, o de que o gosto é subjectivo e ponto final, o tema perdeu importância e é hoje, em sede teórica, inexistente. A não ser, claro, quando se fala da globalização ou da americanização, para dizer que estamos todos a parecer iguais, que comemos as mesmas coisas, temos as mesmas doenças, etc e por aí fora.
Ora, a ausência de reflexão sobre o gosto não impede que o mesmo seja ainda, et pour cause, um conceito operatório, como diria um professor meu. A sua evidência ululante tem-se feito sentir por estas bandas. Arredando qualquer estigmatização social, profissional, mental ou outra, o que é facto é que os alemães não são conhecidos pelo bom gosto. Andar na rua, em Berlim, é como entrar na casa dos horrores do que sobra dos maus cortes de cabelo dos anos 80, dos punks que sobreviveram à overdose, das secretárias que vivem no confortável, dos homens que vestem 2 números acima, do império da sandália com meia de lã.
Tenho que confessar: andei a evitar escrever este post porque temia ser apelidada de reaccionária ou de snob, que serei porventura, mas acima de tudo, andei a evitá-lo porque grassa, cá em casa, a ideia de que o valor da aparência é uma característica dos povos do sul, frívolos, fúteis, tacanhos.
Eu não percebo. Financeiramente, não há quem os suplante. De organização, um esmero. E, depois, é um desfile de curiosidades indumentárias que não se consegue aguentar. E quanto mais o esmero, maior a minhoca. É quando lhes dá a elas para esfarripar uma franja, composta por elementos raros de finíssima penugem alva, e a eles para tirar do armário uma gravata dobrada (sim! é frequente!) de fundo roxo e motivos florais amarelos sobre riscas laranja, é nesses momentos que me pergunto: como é que a Estética nasceu aqui???
Há quem me avise: Berlim é particular. Sim, é mais cosmopolita, as pessoas borrifam mais na aparência. No resto do país, é o império da camisa de seda roxa, com manga tufada e cava ampla, para permitir movimento, combinada com calça preta, muito justa, no armário desde esses saudosos anos 80.
Eu sou uma alien. Perguntam-me frequentemente se sou francesa. Acho que isso não é bom. Esses, lavam-se pouco...
Paradoxos #3
Que o povo alemão tenha tanto dinheiro e vista tão mal, calce pior e penteie horrorosamente.
O nosso blogger-companheiro-do-norte-melancólico escreve um texto a ler, a ler mesmo, sobre Dresden.
terça-feira, junho 22, 2004
Ontem à noite
Ontem à noite. Wiener Philharmoniker dirigida por Ricardo Muti, na Berliner Philarmoniker.
Programa:
1ª Parte: Verdi (Abertura de A Força do Destino, seguida das Quatro Estações, das Vésperas Sicilianas)
2ª Parte: Busoni (uma suite para Orquestra de Turandot), seguido de Respighi (Feste Romane).
Disse que o programa era meio-meio, o que é inteiramente falso: nem Verdi é tão clássico, nem Busoni e Respighi tão contemporâneos...é o que dá a falta de cultura musical...
Mas como me estou nas tintas para afirmações "à Figo", de que se não deve abrir a boca acerca do que não se pratica, aqui vai disto! Ora bem, Verdi é sempre excelente para abrir, sobretudo para um maestro italiano com uma orquestra austríaca, no terreno de um britânico, que dirige uma orquestra alemã... E foi ver Muti a dirigir, de início, com um sarcasmo colossal, tal qual chefe militar a caminho da guerra. Berlim é só a capital da Prússia...e os prussianos, como se sabe, era mais cacetada...
Foi também o momento ideal para mostrar todas as habilidades da orquestra. Os austríacos também queriam revelar aos alemães que sabem de música o que os prussianos sabem de tropa. Resultado: uma exibição deliciosa, em jeito de show-off ou de disputa inter pares - sim, porque a Filarmónica de Berlim só se mede com a de Viena, aqui no Velhíssimo Continente!
A segunda parte foi o corolário da primeira, não só na consagração de Muti como um grande maestro, como na confirmação inexcedível da orquestra. Especialmente com Respighi, cheio de jogos, diálogos e cumplicidades entre os músicos, brilhou a música, no alto, onde Muti acabou pondo os olhos.
A Filarmónica cheia, tudo de pé, vibração geral, durante 10 minutos só palmas. Muti regressou, -já bem preparado, diga-se...- e no meio de umas piadas à acústica da sala (que é óptima!) ofereceu, como aqui não acontece, um encore. Foi o caminho para o êxtase! Muti, como bom italiano, um sedutor.
Para os economistas, com amor...
Eis o que acontece aos economistas ao longo do dia, da semana, do mês - and soyon...
Sem malícia...
segunda-feira, junho 21, 2004
Hoje à noite
Apesar da inveja, há hoje à noite outra vez concerto: desta feita, vem Ricardo Muti e a Filarmónica de Viena.
Programa 50-50. Amanhã farei relato. Prognósticos, como se sabe, só depois do jogo.
Minimalismo
Não abdico: um pequeno-almoço, embora rico em nutrientes, deve ser minimalista em cheiros.
Em recomposição
Despedida das aulas. 10:30 da manhã.
Sobre a mesa, o seguinte:
-caril de frango e arroz árabe;
-doces de Marrocos;
-Sushi de diversas formas;
-"crepes" etíopes com recheio de feijão e legumes;
-porco grelhado com fruta;
-bolos sortidos;
-sumo de laranja;
-café;
-leite;
Eram 10:30 da manhã.
Será possível?
Sociologia de quinta apanha
A professora de alemão, a tal socióloga que transforma a Inquisição numa perseguição às bruxas que sabiam praticar abortos e princípios básicos de contracepção, disse hoje, do alto da sua cátedra:
-O treinador brasileiro disse que estavam em guerra com Espanha - e toda a gente tem comentado. Não ouviram? Eu acho profundamente agressivo e ao mesmo tempo idiota, o tempo que se perde nestas coisas. Mas se os brasileiros são tão bons jogadores, por que razão temiam a Espanha? Não percebo...
É doloroso ainda explicar que o treinador é brasileiro, sim, mas a equipa é mesmo a portuguesa. Ah! E que este é um Europeu...portanto o Brasil, o Brasil, é mais lá prás Américas...
Diálogo na aula de alemão hoje de manhã
-Lembrei-me de ti, ontem, a olhar para o Cristiano Ronaldo.
-Ah foi?
-Sim, belas pernas!...
Ela é chinesa. Isso explicará alguma coisa???
sexta-feira, junho 18, 2004
Já me esquecia!
Duas filas à minha frente, uma rapariga ligeiramente obesa, de tótós e barrete, fazia crochet de linha amarela.
Não é só em Lisboa que ainda ontem amanhávamos os campos e já hoje vamos à ópera...
Outra vez Rattle
Ontem, foi dia de Rattle. Programa anunciava-se difícil: Tan Dun (n. 1957), numa estreia absoluta de "Secret Land", obra para os já famosos "12 violoncelos". Seguia-se Olivier Messiaen (1908-1992), com "Éclairs sur l'Au-delà", última obra do compositor, que já não resistiu para assistir à sua estreia em Nova Iorque, em 1992.
Um programa absolutamente contemporâneo, absolutamente difícil, Filarmónica cheia. Rattle ao seu melhor nível, como de costume, perante a que será "provavelmente uma das melhores" orquestras do mundo.
A obra de Tan Dun, - que assistiu também à sua estreia, um pouco inquieto, da plateia, todo vestido em pele preta...- consistia em 4 retratos interiores, como ele próprio explicita, que não me encheram de modo algum as medidas... A utilização dos instrumentos para produzir sons novos (por exemplo, os instrumentos de sopro foram muitas vezes reconfigurados e transformados em tambores!), bem como o recurso a elementos completamente inesperados (um "ah!" generalizado da orquestra no final, ou uma pateada pelo meio!) são, para mim, como diria uma amiga, "muito à frente". E como diria outra amiga, "ok".
O Messiaen, compositor francês, pelo contrário, faz uma utilização completamente clássica da orquestra e dos elementos sonoros, criando quadros que se adequam a meditações religiosas de matriz católica. Para mim, a peça soou muito irregular, um corpo desarticulado e sem coesão.
Mas isto digo eu que nada sei de música...
Ó Rattle, Simon, para a próxima, dá-me um bombom de chocolate, sff.
quinta-feira, junho 17, 2004
Haverá uma cura?
O escritor Rui Nunes, numa entrevista ao Expresso, em 2001, dizia: "A narrativa é artificial, a fragmentação é que é a realidade. Nós não vivemos nenhuma história, vivemos bocados e perdemo-nos entre uns e outros. É talvez por isso que se escrevem histórias: para dar unidade àquilo que a não tem, para integrar o que surge desintegrado, para dar sentido ao que na verdade não tem sentido nenhum..."
Penso em Joyce, no Ulysses. Penso num dia. Será verdade um dia? Quanto tempo tem uma história? Haverá uma história?
As maiores ficções que li foram autobiografias. Todos nós nos inventamos. Somos, aliás, a nossa maior ficção. Construimo-nos de bocados esparsos, de fissuras do tempo, de impossibilidades de memória, de vivências por meio de fotografias, nós de cabelos, cheiros, rostos. Quantas vezes seria possível contar a minha história!...
Penso de novo em Joyce. Um diário está mais à medida das nossas possibilidades. Joyce foi Joyce, goste-se ou não, reconheça-se-lhe ao menos o génio. Nós estamos à medida do diário. Temos um blog. Um dia, um post, ou dois, ou mais. Tudo junto, bocados entre os quais nos perdemos.
Será o blog uma cura para este mal pós-moderno?
Rui Nunes torcer-se-ia e, na sua habitual demolidora palavra, dir-me-ia - "ó Inês, não há cura!"
quarta-feira, junho 16, 2004
Ganhar, ganhar, ganhar
Ontem resolvi ir ao cinema enquanto dava jogo Alemanha-Holanda e havia paz nas ruas, bilhetes qb e a possibilidade de gozar a 100% o facto de estar em Berlim e não no Porto, debaixo de cacetada. Quando saí, o jogo já tinha acabado. Havia histeria nas ruas. Pensei: ganharam. Apesar do frio e do vento, todo o mundo circulava envolto em bandeiras alemãs. Tive a certeza: ganharam.
Hoje soube que empataram. Decerto o melhor resultado anti-cacetada. Como diriam os nossos políticos, ao estilo retórica-pra-que-te-quero, ganharam a PSP e a GNR. Parabéns, Portugal! É que até dos empates dos outros, sabemos tirar vitórias!
terça-feira, junho 15, 2004
Intelegância
Intelegância é aquela qualidade rara que associa um pensamento belo a um belo pensamento.
Número de milionários cresce mais em Portugal do que na Europa
Ai sim? A mim ainda não foi desta que me tocou a sorte...
You are welcome to Elsinore
Entre nós e as palavras há metal fundente
entre nós e as palavras há hélices que andam
e podem dar-nos morte violar-nos tirar
do mais fundo de nós o mais útil segredo
entre nós e as palavras há perfis ardentes
espaços cheios de gente de costas
altas flores venenosas portas por abrir
e escadas e ponteiros e crianças sentadas
à espera do seu tempo e do seu precipício
Ao longo da muralha que habitamos
há palavras de vida há palavras de morte
há palavras imensas, que esperam por nós
e outras, frágeis, que deixaram de esperar
há palavras acesas como barcos
e há palavras homens, palavras que guardam
o seu segredo e a sua posição
Entre nós e as palavras, surdamente,
as mãos e as paredes de Elsenor
E há palavras e nocturnas palavras gemidos
palavras que nos sobem ilegíveis à boca
palavras diamantes palavras nunca escritas
palavras impossíveis de escrever
por não termos connosco cordas de violinos
nem todo o sangue do mundo nem todo o amplexo do ar
e os braços dos amantes escrevem muito alto
muito além do azul onde oxidados morrem
palavras maternais só sombra só soluço
só espasmos só amor só solidão desfeita
Entre nós e as palavras, os emparedados
e entre nós e as palavras, o nosso dever falar
Mário Cesariny
segunda-feira, junho 14, 2004
Esperem lá...
Se isto
Carlos Coelho:abstenção é a força ganhadora destas eleições
for verdade,
onde está o meu bilhete para Bruxelas???
Em vez de flores...
...morangos - com a cortesia do turco merceeiro que me vende fruta e legumes e hoje me mandou ao funeral da selecção, com os ditos.
Eleições
A Alemanha também votou. Para as europeias, o SPD de Schröder aceita uma "pesada derrota". Para a Turíngia, idem, ganham os conservadores e trepam os novos comunistas. Aqui ao menos há alguém que assume derrotas. Ainda que isso tenha só um tanto de dignidade incluída...
Carpideiras
Todos de semblante carregado, os meus colegas vieram apresentar-me as condolências. Cada um no seu estilo próprio, aproximou-se, voz baixa, grave, séria, ainda disseram "...mas foi um belo jogo, belo jogo".
Pois, deve ter sido.
Para os gregos.
Pontualidade
Diálogo na aula de alemão:
"-Se na minha terra, na Etiópia, as pessoas trabalhassem como na Alemanha, já seríamos ricos há muito tempo.", disse Kidés, etíope bem-disposta que se queixa de não poder chorar em público.
"-Na minha terra, em Xangai, trabalha-se muito mais do que na Alemanha.", disse Johanna, lamentando a falta de oportunidades de emprego.
"-Na minha terra, em Portugal, ...", comecei eu...
-...ninguém chega a horas!"- rematou a professora.
Terceira Lição
"Força Portugal" é um mau slogan.
Razões:
-a colagem ao futebol, cuja selecção se estreou numa daquelas vitórias especiais (as que são derrotas), acabou por reflectir essa mesma vitória...
-a colagem ao futebol ofereceu a leitura de que ir votar ou ver o Inglaterra-França valia o mesmo;
-"Força", é palavra perigosa - havendo já o precedente da queda da sinalética ou da letra, ou temos "orca" ou temos "forca", em qualquer dos casos, mau marketing;
-"Portugal" até ao momento, tanto quanto sei, ainda é uma "nação", e não uma "facção".
Segunda Lição
A culpa existe, a responsabilidade nem tanto e as consequências...que é isso?
-as vitórias (todas, mesmo as que foram derrotas)devem-se à abstenção, que ninguém sabe quem é;
-ou então, ao "efeito Sousa Franco", nas palavras ignóbeis de Assunção Esteves, que também já não está entre nós (um nojo, essa leitura!);
-é impossível avaliar os resultados da direita sem coligação, porque sem coligação não haveria direita, donde a única consequência possível é a da sua manutenção, estilo "pobres, mas honrados";
-o governo regista o recado, mas continua a sua política, porque nunca teve alternativa;
-não há remodelações porque se acabaram os kamikazes;
-acordamos na mesma, ainda que as eleições tenham tido resultados tão estonteantes.
Primeira Lição
...o destino é sempre vitorioso, porque:
-nunca ninguém perde eleições, recebe recados;
-nunca ninguém perde jogos a sério, só os inaugurais.
Schönes Wochenende?
...perguntava eu, à margem do intensíssimo fim-de-semana nacional...
Langes Wochenende, diriam vosotros...
sexta-feira, junho 11, 2004
Conselho pra domingo
"Que pobre a tua ambição de querer companhia à noite, alguém que
te apague
a luz e te agarre os cabelos, alguém que se dispa e baixe, finja
que foge e regresse, alguém que saiba estalar os ossos das tuas mãos.
Que bom aquecermos café, estarmos sempre aos abraços, que bom
já te ter calados com os meus beijos intensos. Passeando, equipados,
junto ao tejo,
pedalando, pedalando até suar, a arder, vidrados na curva, duas rodas
que se metiam uma na outra, tu sim, bicicleta, se aparecesses nos
boletins
de voto valia a pena sair de casa para ir votar em ti, para te eleger
governo."
Helder Moura Pereira, Lágrima
Lindadessuzar-se ou o Manual do Churrasco
Ontem foi dia de reflexão - dia de Portugal à distância, a pensar
raios partam a memória que me traz aos bolsos e à boca as palavras que aí pertencem
nem vou votar, pela primeira vez, nem vou votar
ando a arrumar os cantinhos da minha chegada tuga ao mundo sisudo
ou nem tanto
de Berlim, onde se expõe tudo, de Kirchner a umbigos - é tudo expressionismo afinal.
O jornal dizia que era preciso uma pessoa do sul para dizer aos berlinenses que o verão está aí.
Esfalfei-me, bem alto. No dia seguinte choveu. Será o timbre?
Acho que vim tomada de vírus populares, as festas, a sardinha (que detesto), o som quim barreiros ao seu melhor estilo, chinelar pelas calçadas, falar alto a baixo nível, respirar cerveja, hospitalizar os hooligans - acho que era isso que o minístero pedia, que os hospitalizássemos...-,passar a feira do livro a pente fino para encontrar o Coetzee que me falta, ir votar no domingo e comprar o Expresso com a bandeirinha e tudo, para pôr à janela e fingir que acredito, ir pedir um autógrafo ao Figo e dizer gracías, ainda a Ágata cantando e eu já sorrindo a pensar no amanhã...
Linda-de-suzei-me.
Mangerico, precisa-se.
Ou Xanax, também dá.
quarta-feira, junho 09, 2004
Para uma noção do tempo
O Rei da Ítaca
A civilização em que estamos é tão errada que
Nela o pensamento se desligou da mão
Ulisses rei da Ítaca carpinteirou seu barco
E gabava-se também de saber conduzir
Num campo a direito o sulco do arado
Sophia de Mello Breyner Andresen
O Nome das coisas (1977)
terça-feira, junho 08, 2004
Vagamundo
Acordar para trás
de um “para sempre”
dizer até já e sair
declamar
e derramar
a ausência de um som
que acompanhe um cheiro
se faça voz
dizendo casa casa casa
quando afinal
queria só uma
asa
de voar coxa
e adormecer algures
num ninho.
Ponto negro
Hoje, Vénus atravessa-se calmamente entre a terra e o seu astro-rei - o sol. Os jornais chamam-lhe "ponto negro". Acho mal. Desde quando é que o céu tem acne?
E desde quando é que o planeta do feminino se equivale a um ponto negro? Será só quando tapa o astro-rei???
Pena não vermos mais de perto. Ao contrário do nosso, o planeta Vénus não envergonha quando visto de perto...
E nós, da Terra, a piscarmos os olhos azuis à distância, mau engodo que nem um calhau atrai...
domingo, junho 06, 2004
Dúvida #2
Se um quadro for uma coisa, e se nem toda a coisa for um quadro, o que são essas coisas como quadros que nem são quadros nem coisas?
sexta-feira, junho 04, 2004
Quão a sério é isto?
Faça você também Que
gênio-louco é você? Uma criação de O Mundo Insano da Abyssinia
quinta-feira, junho 03, 2004
Compunha
"A campanha compunha, com pulhice, a nação" - escreveriam os jornais sérios, se os houvesse.
É que esta campanha, em vez de eleitoral, deveria ser reduzida a "leitoral", por:
- ainda não se ter percebido que se trata de eleições europeias, e assim estar tudo em "estado leitoso";
- dar uma vontade irresistível de ir beber um "leite de coco" ali ao Brasil, enquanto a coisa dura;
- já haver o precedente da queda da letra - de "revolução" passámos a "evolução";
- apetecer empurrar estes tipos todos, os aleijados e os outros, até à beirinha d'água, ao litoral mesmo, e depois soprar.
"A campanha compunha para a nação...
l'horreur!"